sábado, 28 de março de 2009


28/03/2009
Só sei que faz tempo e eu era pequeno...

Não me lembro bem que dia era, só sei que era um domingo a tarde de 1989 e eu estava no alto dos meus oito anos. Um registro duvidoso na internet, encontrado após uma pesquisa preguiçosa, me indica 5 de março de 1989. Eu não tenho certeza, mas o que importa? Descobri que ter certeza na vida é muito chato. Perdi muitas coisas porque esperava a tal da certeza. O pior de tudo é que deixei de viver....... Bom, foda-se, não faz diferença, de qualquer forma passaram-se 20 anos. Lembro que joguei bola com meu irmão de manhã na quadra do prédio onde meu pai morava. Depois tomamos banho, almoçamos e fomos para o estádio. Lembro também que havia passado a noite lá no apartamento um amigo do meu pai com o sobrinho dele, e que eles foram embora na hora que saímos para ir ao estádio. O garoto, que devia ter mais ou menos a minha idade, não podia saber que íamos ao estádio.

Era dia de jogo, minha primeira vez no estádio, não lembro de muita coisa. Palmeiras x Botafogo - SP. Acho que Campeonato Brasileiro. Se for março de 1989 é possível, pois o estadual era no final do ano, depois mudou. Também não me lembro se eu pedi para ir ou se meu pai nos levou espontâneamente. Só sei que era palmeirense, no alto dos meus oitos anos, e vivia grudado com uma bola de futebol...só falava de futebol, só desenhava futebol e só jogava futebol. Mesmo porque, com oito anos, nada tem tanta graça quanto o futebol. Tentaram me dar outras camisas, até me fizeram vestir, mas eu era palmeirense, eu era o Edu, o Jorginho, o Odair, o Toninho, o Careca, o Evair.... No alto dos meus oito anos eu já tinha consciência futebolística. Lembro que uns anos antes, em 1986, eu fiquei chateado com a derrota na final do campeonato paulista.

Bem, do tal dia mesmo, lembro da chegada ao estádio. O jogo já estava rolando e o estádio estava muito cheio. Era aquela época da fila dos anos 80, sempre lotado. Times ruins, com alguns destaques individuais e nada de títulos...
Lembro que não conseguia ver nada e a gente ia sempre para o alto, para o alto e nunca chegava. Todas as pessoas eram altas, como meu pai...até os policiais. Lembro que meu pai dizia toda hora: "Na hora que sair gol, segurem-se!!!" Eu não vi porra nenhuma, só um monte de gente alta e a gente indo cada vez mais alto e não chegava nunca. Até que chegamos lá no alto, na grade. De repente um alvoroço. Eu ainda não tinha olhado para o campo direito. De repente eu me apaixonei. Que vista maravilhosa lá do alto...eu nunca tinha visto um campo de futebol, só na televisão. Ah sim, o alvoroço. Pelo que entendi, o goleiro deles pegou a bola com a mão fora da área. Ele estava deitado no gramado, todo esticado, segurando a bola com as mãos para frente na extremidade da grande área. As mãos dele e a bola meio dentro e meio fora da área. Eu não lembro dos gols, só lembro que terminou 3 x 0 para nós e que toda vez que eu estava em São Paulo eu queria ir lá, encontrar meus amigos e ver meus meninos jogarem bola. Até hoje é assim. Encontro meus amigos, encontro conhecidos e por 90 minutos parece que tudo passou e que nada importa. Fico mal quando não estou lá. As vezes eu nem vejo o jogo. Pelo menos por alguns instantes meus olhos se perdem por aí, na imensidão daquele mar de gente. Tem momentos que parecem até que eu estou sozinho, pois esqueço dos meus amigos. O que me importa é estar lá. Nem gritar, nem cantar, nem conversar, nem nada, apenas estar lá e ver tudo acontecer, como sempre acontece. Uma repetição de tudo que eu já vi antes. Um filme que eu tenho decorado na cabeça.

Vai ser estranho o dia que eu não for mais lá. O dia que eu não encontrar eles lá, o dia em que o Marcos não estiver no gol. O dia em que eu não me atrasar, o dia em que as arquibancadas não forem mais arquibancadas. Ah, maldito progresso, deixa o Palestra como está. Eu cresci assim, com o Marcão no nosso gol, com meus amigos do lado, mesmo parecendo que eu estava só, e com arquibancadas de concreto.

É engraçado como me sinto no meio de irmãos, por mais que eu nem saiba o nome de quem está do meu lado. Afinal de contas, o que importa? São todos Deliberallis, Murgias, Romanas, Tremocoldis,...todos falam alto, gesticulam, são teimosos e meio carrancudos. Não tem em lugar nenhum isso e nenhuma outra camisa gera tanta coisa ao mesmo tempo...ódio, amor, inveja, medo....Somos um povo, lutamos contra o preconceito, contra mentiras e contra uma guerra...

No alto dos meus oito anos eu nem imaginava que essa história ia ser assim...